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Antes de escrever este texto fui reler a minha primeira publicação para a Esports.net. Naquele texto, publicado pouco mais de um mês depois do lançamento completo do jogo, uso, no próprio título, a palavra “dissabor” e acho que, honestamente, ela não poderia ter sido melhor usada.

Não sei se algum dos leitores já passou pela infeliz situação de pedir um café em um restaurante e, sem querer, rasgar o pacotinho errado e misturar no líquido um punhado de sal. É exatamente assim que eu me sinto agora. Com o cancelamento da promessa PvE, a Activision Blizzard botou sal no meu café.

Foto oficial de OW2 na loja da Battle.net
Foto oficial de OW2 na loja da Battle.net

Lendo o tweet abaixo, muito parecido a qualquer outro copy comum das grandes desenvolvedoras, esperávamos pouco mais do que o anúncio da quinta temporada, possivelmente algum evento ligado a alguma data especial e, é claro, alguma notícia sobre o bendito modo PvE que, segundo a própria Activision Blizzard, deveria ser lançado nesse ano.

Infelizmente, não poderíamos estar mais errados. Meus amigos, o modo PvE anunciado no palco da Blizzcon de 2019, motivo da adição do “2” no título do jogo foi, depois de quase quatro anos de desenvolvimento, cancelado. 

Chega a ser difícil entender a situação. Voltemos um pouco no tempo. 

Overwatch foi, sem sombra de dúvidas, um dos jogos mais deixados de lado da história dos jogos competitivos. Vamos lembrar que, com uma liga profissional gigante acontecendo, uma legião de fãs e milhares de pessoas jogando todos os dias, o jogo passou de abril de 2020, com o lançamento da Echo, até abril de 2022, com o lançamento da Sojourn na primeira beta aberta de Overwatch 2, sem um novo herói.

Dois anos de abandono  quase completo, com a promessa de um grande lançamento de um modo campanha, com experiências de progressão para cada personagem, chamadas de “Hero Mode”, que funcionariam tanto de maneira cooperativa como single-player, com escolhas e caminhos a seguir, e que, finalmente, proporcionariam ao jogador uma experiência nova a cada run. Tudo isso foi por água abaixo.

Não é exagero dizer que o jogo passou com um grande patch. Os times foram diminuídos de seis para cinco jogadores, vários heróis tiveram os seus conjuntos de habilidades alterados, algumas peças-chave foram mudadas de lugar, mas o jogo continuou, sim, sendo o mesmo jogo. Uma comparação interessante para os jogadores de LoL, por exemplo, é que a mudança de Overwatch para Overwatch 2 sentiu-se como uma grande pré-temporada.

Em especial a pré-temporada de 2016, para quem se lembra, onde foram introduzidos os dragões elementais, que mudaram, sim, o fluxo das partidas, mas não afetaram a essência natural do jogo. 

A questão é que, literalmente, toda a mudança tinha como base a introdução desse novo modo de progressão dentro do jogo.

Overwatch 2 foi lançado em outubro do ano passado basicamente com a ideia de “joguem aí enquanto terminamos o jogo de verdade”, e agora o “jogo de verdade” não vai mais acontecer. A realidade é que com a queda significativa e gradual da audiência na liga profissional e o desconforto da comunidade que se sentia, com razão, deixada de lado, o lançamento foi provavelmente adiantado e apressado, voltando ao comentário anterior: “joguem aí enquanto terminamos”.

Então, se o que dava sentido a Overwatch 2 era o modo PvE, e o modo PvE não vai rolar, qual é o sentido de Overwatch 2?

Aparentemente, e já que o jogo agora é free-to-play, a loja. Uma das grandes mudanças foi que o sistema de lootboxes foi completamente abolido na transição do primeiro título para o “segundo”, e substituído por uma loja de pontos virtuais, muito parecido, por exemplo, com Valorant ou Fortnite. Então, e como foi comentado também no meu primeiro texto, os valores de qualquer skin para os personagens foi para as alturas, e pouco ou nada foi dado às pessoas que jogavam o jogo desde sempre, gerando ainda mais desconforto entre os fãs. 

O trecho a seguir é uma tradução da entrevista durante o anúncio, video linkado no tweet lá em cima. Quem diz a seguinte frase é Jared Neuss, produtor executivo de Overwatch 2, e uma das grandes cabeças do projeto:

“Nós tivemos que tomar uma decisão muito difícil: nós continuamos botando esforço no modo PvE, esperando conseguir lançar em algum ponto do futuro? Ou nós ficamos com o conjunto de valores que nós já nos alinhamos até aqui e focamos no jogo atual e em servir a todos vocês?

Com tudo que aprendemos sobre o que é necessário para operar esse jogo no nível que vocês merecem, é claro que nós não seremos capazes de entregar aquela visão original do PvE que foi mostrada em 2019.

O que isso significa é que nós não vamos entregar o modo dedicado de heróis, as árvores de talentos, aquela progressão de poder a longo prazo. Essas coisas não estão mais nos nossos planos.”

Como fã do jogo, e do universo criado em geral, chega a ser chocante escutar algo assim. Como o próprio produtor executivo diz, o modo PvE e, retomando mais uma vez, motivo principal para o jogo sequer se chamar “2”, não está mais nos planos da Activision Blizzard, e isso já faz um tempo.  

Em entrevista para a GameSpot, tanto Jered Neuss como Aaron Keller, diretor do jogo, comentaram a atual situação do desenvolvimento do jogo e “mantiveram as esperanças lá em cima” com o que está por vir.

O que está por vir? Para quem jogou o evento de Halloween do ano passado, mais missões como aquela, onde os jogadores poderão, sim, jogar com os amigos e derrotar zilhões de NPCs, mas nada de progressão sistêmica, árvores de habilidades e a tão prometida re-jogabilidade. Contudo, nos foi apresentado uma imagem descrevendo quais serão os próximos conteúdos a serem lançados. 

Roadmap anunciado para as próximas temporadas do jogo. Foto: Activision Blizzard
Roadmap anunciado para as próximas temporadas do jogo. Foto: Activision Blizzard

Como se pode ver, uma das grandes promessas da próxima temporada É UMA CINEMÁTICA. 

Mapas novos, dois heróis, alguns eventos de temporada e missões cooperativas descritas anteriormente é o que vem para o futuro de Overwatch 2. O que mais incomoda, no entanto, é o argumento usado pelas cabeças do jogo. Segundo eles, a proporção do projeto se provou ser muito maior do que antecipado anteriormente e que, com o intuito de não fazer o jogo se sentir abandonado outra vez, a desenvolvedora decidiu dar um basta na produção do modo alternativo.

Esse argumento seria perfeitamente entendível se viesse de uma desenvolvedora pequena como a Shiro Games, produtora de Wartales, jogo que roubou muitas horas das minhas últimas semanas, mas não do tamanho da Activision Blizzard, que é dona não só da cashcow que se tornou Overwatch, mas também de Call of Duty, World of Warcraft, Candy Crush, Diablo, Hearthstone, etc. 

Por último, também é interessante pensar nos funcionários da empresa. Desde o anúncio do jogo, lá em 2019, grande parte da equipe de desenvolvedores responsáveis pelo jogo estava trabalhando na parte PvE e, de um momento para o outro, o trabalho de três anos, é deixado de lado.

Esse trabalho, no entanto, não foi necessariamente posto no lixo, já que com certeza, muita da tecnologia desenvolvida ainda será usada, ou adaptada, para futuros heróis, mapas, ou mesmo as missões cooperativas, mas não com o mesmo objetivo pela qual foi criada e isso é, pelo menos desde a perspectiva de um fã, triste.

Mas como agora sabemos, graças a entrevista mencionada anteriormente da GameSpot, no lançamento de Overwatch 2, em outubro do ano passado, a grande maioria dos desenvolvedores já estava trabalhando quase exclusivamente no modo PvP, e a decisão de deixar de lado a versão PvE já teria sido tomada há quase um ano e meio atrás.

É obvio que a notícia não caiu bem com ninguém. Muitas personalidades da cena ficaram, justificavelmente, chateadas e até com raiva, mas a realidade é que Overwatch 2 foi a mais nova vítima de expectativas muito altas, falta de organização da desenvolvedora e pressão interna para que o jogo continue dando dinheiro.

Admirável, realmente, é a coragem do produtor executivo e do diretor do jogo que, querendo ou não, mostraram honestidade e transparência no momento de dar uma notícia devastadora.

Há pouco tempo comentamos sobre as correções para Star Wars Jedi Survivor e sobre como os jogos atuais andam saindo quebrados ou pouco polidos, mas que um jogo dessa magnitude simplesmente não saia, é uma novidade. 

O que seria melhor? Mais um jogo onde as expectativas voaram tão alto que queimaram as asas? Ou o simples cancelamento e era isso? Fica o debate. 

Para mais textos como esse, fique ligado no feed da Esports.net.